No último dia do Mesa Tendências, assisti à palestra de Checho Gonzales, Lourdes Hernandez e Dagoberto Torres (da esquerda para a direita) sobre comida de rua. Comida de rua tem sua estrutura própria. É comida portátil. Lourdes apresentou alguns utensílios da cozinha mexicana, como a prensa para modelar tacos. Checho lembrou que mais que algo rápido e barato para se comer, é trabalho, é sustento de famílias. Acredita que a melhor opção é registrar e capacitar os ambulantes.
No Japão existe comida de rua. Podia encontrar vans ou barraquinhas no estacionamento de supermercados, vendendo batata-doce assada, takoyaki, okonomiyaki, yakitori. Nada disso compete com a loja, pelo contrário, atrai clientes e pode até aumentar as vendas. Em festivais – como queima de fogos de artifícios no verão – ruas são fechadas e dezenas de barraquinhas vendem um pouco de tudo. No Brasil, um país de imigrantes, as opções poderiam ir muito além do pastel com caldo de cana. No entanto, isso é uma questão que envolve alteração de leis e muito mais do que cabe agora neste blog.
David Chang veio falar sobre o aspergillus oryzae, fungo responsável pelo aroma frutado de muitos sakes e que é usado na produção de miso, shoyu e mirim. No caso dele, o interesse se voltava para o “umami”. Aliás, defendeu o ácido glutâmico, porque além da sensação de “gostosura” que sentimos, é algo que nosso cérebro precisa e afirmou que não existe alergia a ele, só sensibilidade. Passou pelo Garum e Liquamen, molho de peixe tão antigo quanto o império romano. Falou do bonito seco (katsuobushi), que passa por um longo processo (2 anos) de maturação para desenvolver mais umami e dos cogumelos e algas que são utilizados no preparo de caldos (dashi). Tudo umami.
No entanto, ele anda experimentando miso feito com outros grãos além da soja: pistache, grão-de-bico, amendoim. Segundo ele, cada um apresenta sabores distintos. Mas o grande tesouro do processo todo é o “tamari”. Tamari é o caldo, rico em aminoácidos, que se separa da massa do miso após um bom tempo de fermentação. É o precursor do shoyu.
Também falou do kimchee e do sauerkraut, similares em tantos aspectos e tão distintos. E, por fim, falou da fermentação da azeitona. Só que, no caso, o interessante não seria o azeite e sim o que é descartado: o caldo fermentado. Ou seja, umami, umami e umami. Não vou escrever sobre miso, kimchee, koji, etc. Já falei sobre isso, basta dar uma busca no blog.
Atala subiu ao palco ao lado do pecuarista Ricardo Sechis e do ambientalista Roberto Esmeraldi. Lembrou do desafio de alimentar 7 bilhões de pessoas e que é preciso encontrar um uso mais racional do solo. A pecuária tem sido criticada nos últimos anos, acusada de ser a causadora de desmatamento e por conta da extensa área que ela consome, por exemplo. Ricardo Sechis voltou-se para outro lado, para a criação de gado confinado. Mais que isso, adotou também um outro manejo do boi, que inclui água limpa e salário justo para quem trata dele. Para garantir a qualidade da carne, usa um recurso que os produtores de wagyu também recorrem: o utrassom para analisar as fibras musculares. Roberto Smeraldi lembrou que não basta um produtor desenvolver um gado premium, mas é preciso ter para quem comercializar e que pague pela excelência. Trata-se de uma cadeia.
Atala lembrou também que muita gente não consome as partes menos nobres do boi e que muita coisa é simplesmente descartada. Concordo. Compro rebarba, retalhos para fazer comida de cachorro, na base de um pacotão por R$5,00, separo tendões e encontro até a capa que cobre a costela (matambre?). Infelizmente muita gente exige mignon, contrafilé, picanha, etc quando vai jantar fora, esquecendo que um corte de segunda pode ser muito saboroso e não é raro ter um preparo demorado. E ainda há a questão de aproveitar o máximo do alimento -seja ele animal ou vegetal.
Se por um lado é bom que alguém que atrai tantos ouvidos trazer duas pessoas para falar – de pontos de vistas bem distintos – sobre uma questão que envolve alimento e sustentabilidade, por exemplo, terminei com mais questionamentos que respostas. Afinal, de onde sairá a comida para os 7 bilhões de humanos? A resposta não é tão fácil. Ou melhor, respostas, porque pessoas e situações diferentes precisam de soluções diferentes. É algo que ficou para se pensar.
