Não é raro alguém me escrever perguntando sobre fazer sake em casa. Geralmente respondo que não é tão simples assim. Há uma semana tive a oportunidade de saber mais sobre o processo de produção de um bom sake com o mestre de produção dos sakes Hakkaisan, sr Shigemitsu Nagumo e o Diretor do Sake School of America, sr Timothy Sullivan.
Primeiro: sake é composto, na maior parte, de água. Cerca de 82% de uma garrafa de sake é água. Então, para um bom sake, é preciso de uma água boa. Alguns produtores usam águas ricas em minerais, outros não. Obviamente, é preciso que a água seja limpa. No caso da Hakkaisan, é água de degelo, vinda de uma região protegida por leis ambientais. A quantidade de mineirais da água interfere na fermentação, tanto para o bem quanto para o mal. Mas isso depende também de outros fatores.
O arroz. Para a fabricação de sake existem variedades específicas, diferentes das que consumimos para comer. Não sei se no Brasil alguém planta essas variedades. Além da qualidade do grão, o arroz pode ser polido até restar apenas seu núcleo, rico em amido. Isso vai depender muito do tipo de sake que se quer produzir.
Koji: é arroz maltado ou seja, um arroz cozido no vapor que foi contaminado com esporos de um fungo (Aspergillus Oryzae) e mantido em condições específicas para que ele se desenvolva. Esse fungo produz enzimas que convertem o amido do arroz em açúcares. Mas também produz outras enzimas. Por exemplo, uma que quebra proteínas em aminoácidos. Cada enzima é ativada em determinada temperatura. Ou seja, durante esse processo é preciso observar a umidade e a temperatura do local. E saber o ponto certo para parar, já que quando o fungo começa a liberar esporos também começa a produzir um ácido, o ácido kójico, que dá um sabor ácido e desagradável. Um bom koji tem um aroma agradavel e um sabor adocicado. Mesmo hoje em dia, a experiência de um profissional é fundamental, mesmo em grandes fábricas de sake.
Além disso, é preciso um fermento, que irá converter o açúcar do koji em álcool. Essa fermentação pode durar de 2 a 4 semanas, ser em diferentes temperaturas mas, geralmente, são no frio (no caso da Hakkaisan, em torno de 7 °C ). A mistura de koji, fermento e água é misturada 2 vezes por dia, para arejar. Alguns produtores ainda usam o método manual, outras automatizaram parte da produção. Muitos sakes recebem a adição de álcool extra.
Completada a fermentação, o líquido é coado (por gravidade) ou prensado. Isso também vai depender muito do tipo de produto se quer obter. Segundo me explicaram, um sake coado tende a ser mais límpido que o prensado.
E então esse líquido vai para tanques de maturação. Pode receber mais água para baixar o teor alcoólico, pode ser filtrado novamente, pode ser pasteurizado ou não.
O último passo é o engarrafamento.
Ou seja, apesar dos poucos ingredientes, a produção de um bom sake envolve muitas sutilezas, detalhes, cuidados e experiência. Em casa posso até fazer um sake (ruim, na verdade), apenas pela diversão de experimentar e testar. E, caso dê tudo errado, acabo com vinagre de arroz.
Muita gente pensa que sake só combina com comida japonesa. Não é bem assim. Hoje muitos restaurantes estão oferecendo sakes para acompanhar os mais diferentes pratos. No caso dos sakes que provei, eles são secos mas claros, ou seja, não têm um sabor tão persistente. Entre um bocado e outro, refrescam o paladar. Obviamente, não são todos assim. Já provei sakes muito aromáticos e com sabores persistentes e que seriam difíceis de harmonizar com pratos. É o tipo de bebida eu iria preferir depois da refeição. A quantidade e qualidade dos sakes que podem ser encontrados no Brasil é bem razoável. Como são produtos importados, não são muito baratos, não é raro que sejam mais caros que alguns vinhos. No entanto, creio que é algo que precisa ser provado, pela experiência em si.
Isso tudo e mais um pouco fiquei sabendo nessa conversa que aconteceu na Adega de Sake. Os petiscos são do restaurante Aizomê. O convite veio da Zendai e reuniu tanta gente que entende de sake que eu fiquei quieta, para não falar besteira.
Estou certa de que a iniciativa dos produtores de sake vai trazer frutos dentro de pouco tempo e esta bebida deliciosa será mais bem compreendida e devidamente aproveitada. Além de mais facilmente encontrada. Ganhamos nós, os apreciadores que ainda nem tivemos chance de ser conhecedores.
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