Uma das coisas que eu gostava no seriada “Jornada nas Estrelas” (sim, já fui criança e adolescente, embora há muito tempo) eram as discussões entre o doutor Spock e o capitão James Kirk. De um lado, uma racionalidade que não se deixa levar pelo calor do momento nem pelas emoções. De outro, um oficial com responsabilidades mas que era também um sujeito passional e que até poderia apelar para recursos de ética questionável.
Eu moro em uma pequena propriedade na zona rural. Tenho espaço suficiente para ter uma casa, manter uma distância saudável dos vizinhos, silêncio e ar limpo. A horta, em parte, surgiu por um motivo prático: é preciso manter o terreno limpo para não ter a casa invadida por aranhas, lacraias e até cobras. Mas poderia ter plantado grama que resolveria o problema. Mas a horta ainda renderia algumas verduras e muita atividade física.
Sabia também que seria um pequeno desafio recuperar um solo desgastado, fazer compostagem, buscar esterco em outras propriedades, contaminar o solo com fungos “bons”, pesquisar opções de controle de pragas. Tive algumas decepções com inseticidas biológicos, alguns inseticidas liberados para cultura orgânica são razoavelmente eficientes.
Agora temos o problema de água.
Em termos de economia, garanto, nem sempre é mais barato plantar que comprar na feira. Isso é quase um padrão quando se trabalha com produtos em pequena escala, seja automóveis quanto alface.
Isso é bem irracional, não, doutor Spock?
Mas há algo imensurável em ter uma horta, ou ter 2 cães e 4 gatos ou fazer pão em casa.
Há a satisfação pessoal de realizar algo, mesmo que pequeno. Há a satisfação de ver crescer e comer algo que não encontro no supermercado. Invisto em plantas que andam desaparecidas, como o cará-moela, o melãozinho do mato (nashi-uri), vagens. Plantamos, fazemos as pessoas provarem, distribuímos mudas e sementes, num trabalho de formiga para disseminar variedades que não têm valor comercial.
E também ganho ou compro sementes exóticas, que ainda não se tornaram populares por aqui. E faço o mesmo, tentando convencer as pessoas a cobrarem maior diversidade na feira, no prato.
Isso faz com que eu tenha um relacionamento bom com meus vizinhos. Eles gostam das verduras estranhas, do pão, do bolo que faço.
E eu também ganho feijão novo, ovos caipiras, mudas de orquídeas.
Nesse tempo meu lar ganhou um espaço verde e um tanto quanto caótico. Nunca apareceria em uma revista de jardinagem e paisagismo.
Por esse aspecto, eu diria que o ser humano é o único animal que gasta energia fazendo coisas que não servirão para garantir sua sobrevivência, nem sua segurança ou do seu grupo. Justifica alegando satisfação pessoal e incremento do bom-relacionamento social.
Sim, o ser humano é um animal que faz coisas aparentemente irracionais e fica feliz.
Engraçado que tanto este post quanto o anterior explicam exatamente aquilo que penso e que nunca tinha chegado a tentar explicar, nem a mim mesmo. Ou seja, depois de ler aquilo que você escreveu, me dei conta de que não devo estar tão errada em teimar e insistir fazendo coisas que ninguém entende por que motivo eu tanto preciso fazer. Me pus de castigo sem comprar mais nenhum livro até terminar de ler todos que estão aqui me esperando chegar neles, mas este do Pollan vou procurar sim, que é do tipo que some depois de algum tempo. Deve ser muito bom.
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Leia sim. Acho uma temeridade o que as pessoas estão fazendo, digo, deixando a responsabilidade da própria alimentação a cargo da indústria. Pode ser danoso em termos de saúde mas é, sem dúvida, danoso em termos sociais e culturais.
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Marisa que excelente texto. Faço minha as suas palavras e também as palavras da Gilda (também me pus de castigo kkkkk). Vou já comprar o livro. Era vegetariana até meus cabelos ficarem fraquinhos, caindo direto, unhas super quebradiças e GORDA!! Mudei tudo. Me aventuro agora no estilo de vida Páleo (com pré e probioticos) e estou gostando muitíssimo. Emagreci também kkkkkkk
Concordo completamente com seu comentário “Mas há algo imensurável em ter uma horta, ou ter 2 cães e 4 gatos ou fazer pão em casa.”
Só não tenho gatos. Já fiz muito pão em casa pra família e muitos frangos caipiras soltos no quintal e ovinhos frescos (45 +ou- por semana). Isso não tem preço. O mundo tem salvação. Nós existimos! kkkk
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Eu também fui quase vegetariana (eventualmente comia carne) por algum tempo, há muitos, muitos anos. Engordei e minhas unhas desfiavam com facilidade.
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Eita Marisa! Meu comentário saiu duplicado!!! Não entendi! kkkkk
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Marisa, fui criada no interior de SP e convivi muito com a horta da minha querida Batian. Não somente a horta, mas a fabricação do tofú e shoyu. Me lembro de vê-la abatendo as galinhas e até mesmo o porco, para depois manter a carne (suína) em barris cheios de banha, pois não havia uma geladeira.Sinto saudades do pilão de moti, onde muitas vezes ví batian e ditian socando o arroz e depois nos agraciavam com deliciosos bolinhos. Ela também tinha cães, gatos e galinhas soltas no quintal e o seu texto me trouxe um que de nostalgia. Enfim, hoje moro em São Paulo há mais de 40 anos e, penso cada vez com mais frequência, em voltar a morar no interior, num terreno espaçoso cultivar as minhas flores, cultivar uma horta, em busca de uma vida de melhor qualidade.Não sei se é irracional mas espero com isso ser mais feliz.
Muito obrigada pelo texto e me desculpe se fiquei divagando demais. Bjs
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Adorei seu texto! E ainda me fez lembrar um saudoso professor de anatomia, que dizia que o homem é o único animal que salga o que vai comer…
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Não é, para o animal humano, a satisfação pessoal imprescindível a sua sobrevivência? 😉
Lindo blog!
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